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terça-feira, 12 de outubro de 2010

CRESCIMENTO ECONÓMICO E DESENVOLVIMENTO HUMANO: A RESPONSABILIDADE SOCIAL DAS EMPRESAS

O desenvolvimento sustentável, visto numa óptica de satisfação das necessidades presentes sem comprometer a qualidade de vida das gerações futuras, conjugando por isso interesses económicos, sociais e ambientais, é um tema candente da actualidade política e empresarial em quase todos os países do mundo. Na Europa, por exemplo, destacam-se as iniciativas da Comissão Europeia com a publicação em Julho de 2002 do Livro Verde sobre a Responsabilidade Social das Empresas enquanto documento orientador das estratégias de desenvolvimento sustentável a longo prazo que se pretende para o espaço europeu, e o lançamento em Maio de 2006 de uma comunicação intitulada “ Implementação da parceria para o crescimento e o emprego: tornar a Europa um polo de excelência em termos de responsabilidade social das empresas.”

Esses documentos põem em relevo a importância de uma gestão privada socialmente responsável empenhada não só em maximizar a remuneração do capital investido, mas também comprometida com a causa social e ambiental do seu meio envolvente. De um modo geral, essas orientações de caracter estratégico procuram incentivar a ética e uma postura socialmente responsável no meio empresarial, introduzindo um leque de conceitos correlatos tais como Cidadania Empresarial, Eco-Eficiência, Ética Empresarial, Responsabilidade Social e Balanço Social entre outros.

Efectivamente a redução dos desníveis económicos, o combate às desigualdades sociais e a busca de uma maior justiça social, já não podem ser considerados como sendo tarefas e responsabilidades apenas dos órgãos do poder público. Os empreendimentos privados e mesmo as organizações de um modo em geral devem assumir plenamente um compromisso como parceiros na implementação de políticas sociais e ambientais, contribuindo cada um à sua maneira para a melhoria da qualidade de vida da sua comunidade e da sociedade em geral . É neste contexto que a Responsabilidade Social das Empresas se enquadra, como um novo modelo de abordagem da gestão empresarial na perspectiva de aumentar o grau de eficiência no relacionamento e numa postura ética da organização com a sua comunidade de acolhimento.

Com efeito, não se pode confundir a responsabilidade social das empresas com acções filantrópicas ou assistência social que se limitam a actos de benevolência com a atribuição de apoios pontuais a quem precisa. Trata-se sim de uma questão estratégica de competição e de imagem corporativa num mundo globalizado com repercussões no resultado económico e financeiro da empresa porquanto incorpora vantagens competitivas como factor de sucesso na luta pela sobrevivência e adaptação organizacional que as instituições do sector privado em particular enfrentam actualmente.

Podemos ilustrar esta afirmação contrapondo com o caso da empresa de material desportivo NIKE que sofreu um revés na sua actividade quando, por ocasião da Copa do Mundo de 1998 em França, foi publicamente denunciado o facto de os calçados dessa marca serem produzidos por crianças subnutridas e descalças da Indonésia. Essa denuncia afectou negativamente não só a imagem e a reputação da NIKE como inclusive reflectiu nas suas acções na Bolsa de Valores em Nova Iorque. Este exemplo evidencia a importância da acção social responsável no mundo empresarial e demonstra que efectivamente além do preço e da qualidade dos produtos e serviços, o engajamento das instituições privadas em programas sociais também contribuem para fidelizar clientes e por conseguinte influenciar positivamente a imagem corporativa e potenciar as vendas.

Efectivamente, o atraso de certas regiões do mundo, e que estão na base de certos conflitos e tensões, explica-se, em parte, pelo facto do sector empresarial não ter tomado consciência das suas responsabilidades sociais, tendo por isso primado tão-somente pela maximização do seu capital.

A nível nacional, Cabo Verde tem razões de sobra para se orgulhar do sucesso alcançado não só no domínio da atracção de investimentos externos, como também na mobilização de investimentos privados nacionais, e podíamos citar alguns exemplos de grandes unidades hoteleiras, Resorts, Villages entre outros. Não ha duvidas de que estamos praticamente no ponto de partida, tendo pela frente um longo caminho ainda a percorrer no campo do desenvolvimento económico e consolidação da actividade empresarial nacional. Mesmo assim importa reflectir ou trazer para debate esse novo paradigma no pensar e agir no mundo empresarial, denominada também de responsabilidade social corporativa que vem ganhando terreno a nível mundial através da construção e consolidação de um discurso ético de responsabilidade social e ambiental nas organizações empresariais.

No último triénio o volume de investimentos aprovados pela autoridade competente em Cabo Verde ultrapassa a média dos 600 milhões de Euros por ano, sendo que em 2008 a previsão aponta para um volume de 2,4 biliões de Euros só em investimentos directos externos. Ora, se 1% do valor de investimento subjacente a cada projecto for aplicado na melhoria das condições de vida da comunidade de acolhimento do empreendimento em questão, teremos uma contribuição significativa do sector privado na luta pela redução da pobreza e das desigualdades sociais em Cabo Verde. Afinal o que representa 1% num investimento que ascende a cifra dos 650 milhões de Euros (valor, segundo a imprensa, envolvido num dos projectos de imobiliária turística em curso na ilha de Santiago)? Entretanto esse montante, para a comunidade, representa uma contribuição de grande valia na melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes. Assim, o enquadramento social de um projecto de investimento na sua comunidade de acolhimento devia considerar uma percentagem mínima para participação em programas de formação e qualificação da mão-de-obra local, para estabelecimento de parcerias sociais com escolas, creches, projectos de saneamento básico e protecção do meio ambiente entre outras acções na âmbito da comunidade local.

Existem determinados países em que bairros de alto padrão de qualidade de vida, com condomínios de luxo, contrastam com a miséria e o caos reinante nos bairros carenciados mesmo em redor. Naturalmente esta não é uma paisagem que se quer para o Cabo Verde do futuro. Por conseguinte, em matéria de Responsabilidade Social das Empresas, há que começar por algum lado ainda que seja apenas pelo discurso.



Publicado no Liberal em 03/11/2008

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