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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

O DESPORTO E A AFIRMAÇAO DA IDENTIDADE NACIONAL

Você, que esta lendo este pequeno texto, consegue imaginar uma grande festa nas ruas do Rio de Janeiro com o carioca todo trajado a vermelho a comemorar o triunfo do Benfica como campeão de Portugal? Arre! Absolutamente impossível idealizar semelhante cenário surreal, embora o Brasil tenha sido colónia de Portugal, à semelhança de Cabo Verde. O povo brasileiro alcançou a sua emancipação como nação que soube construir uma identidade própria que o define e caracteriza a nível mundial e que, no essencial, assenta sobre os três pilares da cultura brasileira: Futebol, Samba e Carnaval.

Nós, os cabo-verdianos, temos um défice em relação a nossa identidade nacional, muito embora o povo destas ilhas tenha procurado, desde muito cedo, afirmar-se pela via da construção de uma identidade própria edificada por componentes linguisticos, musicais e literários de matizes bem distintas da cultura do colonizador. No campo desportivo, contudo, existe um longo caminho a percorrer, até a conquista da nossa auto-afirmação e assim deixarmos de venerar o futebol português.

O desporto entendido como um fenómeno social, afigura-se como um importante elemento aglutinador da identidade cultural de um povo, pela sua capacidade de fomentar o sentimento de pertença, de união, de identidade e de nacionalismo. Sempre foi assim, desde os tempos remotos, pelo que não se pode aceitar com normalidade, entre nós, esse estranho fenómeno de admirar, festejar e venerar clubes, atletas e vitorias dos outros. Sim dos outros! Do antigo colonizador.

“Mulheres, homens, jovens, crianças de vermelho vestidos abraçavam-se, beijavam-se, para comemorar o título do campeão português de futebol...”. Ao ler este trecho de uma noticia aqui no país, um visitante recém-chegado teria perguntado, meio confuso: Mas, afinal, estou em Portugal ou em Cabo Verde!?

Não se pode subestimar a importância do desporto como elemento marcante da identidade de um povo. É difícil falar da Grécia antiga, por exemplo, sem se referir à cidade de Olímpia e às suas famosas competições desportivas entre as Cidades-Estados que periodicamente ali decorriam. Uma das virtudes da civilização grega, é sem dúvida, o legado dos jogos olímpicos que o povo helénico nos transmitiu desde a era Antes de Cristo.

Em Cabo Verde, as várias conquistas nos diversos sectores da cultura cabo-verdiana designadamente na literatura, com o movimento claridoso a traçar um caminho totalmente autónomo, muito antes da independência política das ilhas, não tiveram o mesmo paralelo no campo desportivo como teve na música e noutras esferas da cultura cabo-verdiana.

Há bem pouco tempo, Mário Soares, numa das suas tiradas totalmente extemporânea, defendeu que Cabo Verde não deveria ter sido independente e que o arquipélago teria muito a ganhar se mantivesse sob domínio de Portugal. O que este político português provavelmente não sabe, é que no domínio do desporto o cabo-verdiano continua vassalo de Portugal e é precisamente neste sector onde menos avançamos. Estou convencido de que só conseguiremos algo de positivo a nível do desporto, no dia em que o cabo-verdiano alcançar maturidade suficiente, nesta matéria, e passar a apoiar os clubes, as conquistas e as vitorias dos atletas nacionais e, deste modo, festejarmos o que, de facto, é nosso!

Nessa luta temos um grande opositor a vencer. Trata-se da mídia cabo-verdiana que nos tem prestado um mau serviço. Quantas vezes já tivemos a oportunidade de observar que enquanto se disputa uma partida de futebol no Estádio da Varzia a televisão nacional transmite jogo de algum campeonato europeu? Alias ninguém entende por que razão a televisão nacional, dá-se ao luxo de alterar totalmente a sua programação habitual, inclusive o Jornal Nacional das 20 horas, para transmitir um jogo qualquer do campeonato português.

Resta-nos o conforto das palavras do Senhor Ministro da Educação e Desportos que ao anunciar a aprovação da nova lei de base do sistema desportivo cabo-verdiano,  vaticinou que  “Estamos a construir uma nova era no desporto no País”. Oxalá que esta visão signifique um passo para a conquista da nossa independência nesse sector. Amém! 

Publicado no Jornal  "A NACAO" Nº 142 de 20/05/2010  e no Liberal

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O SUÍNO, A GRIPE E A FARSA

Afinal a pandemia da gripe suína foi só um susto. Mas não um susto inocente e despropositado, desses que a gente prega a uma pessoa amiga que não víamos há muito e assim aproximamos devagarinho pelas costas, tapando-lhe os olhos com as mãos. Não, não é desse tipo de susto que estou falando. Quase já virou moda assustar o mundo com ameaça de pandemia e assim criar condições para a indústria farmacêutica facturar uma grana preta, às custas do desespero de cada um. Foi assim com a gripe-das-aves. E agora com a gripe suína. Vamos esperar para ver o que nos vão arranjar da próxima.

Foi terrível a notícia da pandemia de gripe suína. Quando foi anunciado o primeiro caso registado num povoado do interior montanhoso do México, o mundo inteiro arrepiou-se só de ouvir falar desse estranho vírus oriundo de suínos. Os porcos são animais repugnantes, vivem na lama, é de se esperar que uma doença originária desses animais nauseabundos, transmitida aos humanos pela via respiratória, causasse pânico a nível mundial. Entretanto, os gigantes da indústria farmacêutica esfregaram as mãos de alegria com a possibilidade de lucro à vista. Já dizia o velho ditado: O mundo pertence aos espertos.

Hoje, mais do que nunca, estou convencido de que tudo o que vem do porco dá dinheiro. É lucro garantido. Torresmo, chouriço, presunto e agora o vírus H1N1. Em Cabo Verde não é novidade admitir que quase todas as famílias engordam o seu porquinho, porque sabem que ter um porco gordo no chiqueiro é a certeza de ter um bom pé-de-meia para momentos de maiores apertos. O que não era de se esperar é que multinacionais do ramo farmacêutico, também vissem nessa tal espécie oportunidade de ganhar dinheiro, da forma como o fizeram. Só o Governo Francês tinha inicialmente encomendado 94 milhões de doses da vacina contra a gripe suína, por uma soma total de quase 900 milhões de Euros suportados pelo erário público.

Um excelente negócio para a industria farmacêutica. Mas o tiro saiu-lhes pela culatra. Quando perceberam que o cenário dantesco de um universo completamente suíno-gripado não se ia consumando, eis que entraram em pânico sobretudo com a pandemia de cancelamento das encomendas. Primeiro a Alemanha, depois a França, cortaram pela metade a encomenda das vacinas uma vez que se confirmou que apenas uma dose, e não duas como inicialmente recomendado, é suficiente para imunizar uma pessoa.

Na opinião do Presidente da Comissão de Saúde do Conselho da Europa, a campanha da “falsa pandemia da gripe, criada pela OMS e outros institutos em benefício da Industria Farmacêutica, é o maior escândalo do século, na Medicina” e ordenou a abertura de uma investigação sobre o caso. “O diagnóstico era falso e custou muito dinheiro. Só na Europa, foram gastos 5 mil milhões de Euros com as vacinas para a gripe A”.

Em Cabo Verde se toda a atenção das autoridades sanitárias não estivesse direccionada para a questão da gripe A, quem sabe, poderiam ter detectado atempadamente a presença da dengue nas ilhas, que segundo os entendidos nessa matéria, tem praticamente os mesmos sintomas da gripe suína. Este sim, foi um bom susto para todos nós, e o fantasma não está ainda totalmente esconjurado.

E nesta história, ninguém saiu perdendo. É como quem diz, no açougue do gado suíno nada se perde, tudo é aproveitado, inclusive as miudezas. E como que fazendo jus ao ditado, o menino de quatro anos a quem foi diagnosticado o primeiro caso de gripe suína no México, foi imortalizado com uma estátua de bronze colocada no povoado onde vive, para atrair turistas. Sim, para atrair turistas!

E assim, esse quadruple, amaldiçoado, incapaz de olhar aos céus, continua, como sempre, no epicentro dos bons negócios, aqui ou lá fora.

Publicado no Liberal em 15/02/2010
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=27228&idSeccao=527&Action=noticia

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A IMPORTANCIA DA TACV SER MEMBRO DA IATA

A TACV foi recentemente admitida como membro de pleno direito da IATA, a Associação Internacional de Transporte Aéreo -  em inglês, International Air Transport Association ou simplesmente IATA, como é mundialmente conhecida.

Para uma melhor compreensão deste tão importante passo na historia da Transportadora Aérea Nacional, importa recuar um pouco no tempo e observar, ainda que em breves trechos, o papel da IATA como motor de todo o processo de desenvolvimento do negócio da aviação comercial no decurso do século 20.

1919, o ano em que chega ao fim a Primeira Guerra Mundial, é considerado como o ponto de partida da actividade de transporte aéreo comercial, com a realização do primeiro voo internacional entre Londres e Paris. Tão cedo, iniciou-se o serviço de transporte aéreo regular, os operadores logo perceberam tratar-se de um sector que envolve grande complexidade e interdependência entre Estados soberanos e companhias aéreas. Um negocio sem fronteiras, que exige à partida um organismo internacional para auxiliar e orientar a industria na resolução das questões mais pertinentes.

Nesse mesmo ano de 1919, foi então criada em Haia, a International Air Traffic Association, a entidade percursora da IATA  dos nossos dias. Embora o sector estivesse, nessa altura, a ensaiar os primeiros passos, já existiam questões de caracter internacional que demandavam por resposta urgente. E, de facto, os operadores da industria de aviação civil, cedo, viram-se confrontados com uma série de interrogações que não podiam ser resolvidas de forma unilateral.

Questões relativas às Liberdades do Ar, à fixação de tarifas internacionais para viagens que envolvem mais de uma companhia aérea em países com diferentes tipos de moeda, à determinação de critérios de rateio das tarifas após a utilização dos bilhetes e sistema de compensação entre as companhias de diferentes países, a questão de padronização dos procedimentos comerciais e operacionais particularmente em operações internacionais, a questão da responsabilidade civil dos transportadores, são apenas alguns dos principais problemas que careciam de soluções, somente possíveis, no âmbito de uma entidade associativa de caracter internacional.

Em 1929, foi realizada uma primeira convenção que ficou conhecida como sendo “A Convenção de Varsóvia”. Esse primeiro evento impulsionado pela International Air Traffic Association, procurou disciplinar e limitar a responsabilidade das companhias por danos causados durante o transporte aéreo internacional de passageiros e respectiva bagagem, Carga e Correio, bem como a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional.

A tecnologia de aeronaves em geral, desenvolveu-se bastante, durante o período compreendido entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial e possibilitou a construção de aviões maiores, com potência para percorrer longas distâncias, em altitudes maiores e mais rapidamente. Propulsores a jacto, avanços na ciência de aerodinâmica, melhorias na tecnologia de rádio-telecomunicações e de navegação aérea deram um grande impulso a aviação comercial. Na mesma proporção, aumentaram os desafios organizativos, legais e regulamentares  para o negócio.

Quando a Segunda Guerra já estava praticamente no fim, em Abril de 1945, a International Air Traffic Association foi transformada em International Air Transport Association - IATA, com sede em Montreal Canada, assumindo  novos objectivos e desafios a vencer, com vista a criar condições adequadas ao desenvolvimento sustentado do negócio de transporte aéreo.

Os principais desafios da recém-criada Associação eram de natureza tecnico-operacional, porquanto a segurança e confiabilidade dos passageiros sempre tem sido condição sine qua non para o sucesso de qualquer companhia aérea. Assim, desde a sua criação, a IATA trabalhou em estreita colaboração com a ICAO – International Civil Aviation Organization – a Agência especializada da ONU para assuntos da Aviação Civil, com sede também em Montreal, Canada. Num esforço conjunto, foi em 1949, realizada a Convenção de Chicago, tendo sido aprovado o tratado que ainda hoje rege, no essencial, a conduta da Aviação Civil Internacional.

Por outro lado, era também urgente a necessidade de padronizar certos procedimentos e praticas, tendo em vista o estabelecimento de normas que dessem suporte legal e regulamentar ao negócio de transporte aéreo.

Foi, então, realizada a primeira Conferência Mundial de Tráfego no ano de 1947, na cidade do Rio de Janeiro, em que foram aprovados um total de quatro centenas de resoluções, abrangendo diferentes aspectos do transporte aéreo. Regras de construção tarifária e subsequente rateio e compensação, franquia de bagagem, padronização de bilhete de passagem e carta de porte, processo de credenciamento das agências de viagens, entre outros assuntos foram acordados nessa reunião pioneira. 

As decisões saídas dessa primeira conferência internacional dos membros da IATA viriam a reflectir, nos anos subsequentes, em acções concretas com a criação da Câmara de Compensação, hoje conhecida pela sigla ICH, IATA Clearing House, organismo da IATA responsável pelo sistema de compensação entre as companhias aéreas. 

Foi também implementado um sistema de acordo multilateral de trafego entre as companhias aéreas, conhecido pela sigla MITA – Multilateral Interline Traffic Agreement, em que numa base de reciprocidade as companhias passaram a emitir e aceitar  entre si documentos de tráfego que posteriormente são processados pela Câmara de Compensação.

A rede de distribuição e comercialização dos serviços ganhou novo fôlego com o estabelecimento de regras que regem o relacionamento entre as companhias aéreas membros da IATA e seus agentes credenciados.

A criação do BSP – Billing and Settlement Plan, uma espécie de Banco da IATA, - com a missão de facilitar e simplificar os procedimentos de venda, facturação e cobrança, bem como melhorar o controlo financeiro e fluxo de caixa das companhias membros - veio potenciar a capacidade de distribuição das agências de viagens. Actualmente o BSP movimenta um volume anual de cerca de 240 bilhões de dólares, abrangendo 160 países e territórios e servindo 400 companhias aéreas em todo o mundo. Existe actualmente cerca de oitenta mil agentes de viagens credenciados pela IATA em todo o mundo.

No período pós 1945 até a primeira crise de petróleo em 1973, o sector de transportes aéreos cresceu a uma taxa de 2 dígitos a nível mundial. Todos são unânimes em reconhecer que tal crescimento não seria possível sem a extraordinária capacidade de liderança do sector, assumida ao longo desses anos, pela IATA que soube acompanhar o dinamismo do sector de transporte aéreo impulsionado pela inovação tecnológica.

Efectivamente, esse período foi marcado por grandes avanços tecnológicos que permitiram a introdução de aeronaves turbo-hélices e aviões transatlânticos na década de 1950/60, incorporando aviónicos avançados. Lançado em 1968 e apelidado de Jumbo, um gigante, com capacidade para transportar mais de 500 passageiros, o B747 foi o maior avião comercial do mundo até 2005, quando o Airbus A380 fez o seu primeiro voo. 

Os avanços tecnológicos tiveram um reflexo directo na redução dos custos e das tarifas aéreas e, por outro lado, no aumento do conforto dos passageiros. O efeito a nível dos mercados foi uma explosão da demanda por viagens aéreas.  

O crescimento exponencial do sector de transportes aéreos conduziu a uma maior complexidade das operações, maiores desafios e responsabilidades para a IATA como organismo internacional cuja missão consiste em representar, liderar e servir a indústria aérea.

Enquanto no século 20 assistiu-se ao nascimento e ascensão formidável da indústria de transporte aéreo, os primeiros anos do século 21 foram difíceis e de grandes desafios para a viabilidade da aviação. Os terríveis acontecimentos de 11 de Setembro revelaram a fragilidade económica de uma série de grandes companhias aéreas. Não se pode também ignorar o impacto das pandemias ao redor do mundo como a gripe-das-aves e a gripe A e, por último, a crise financeira mundial.

O aumento quase incontrolável do preço dos combustíveis, o agravamento de impostos e taxas aeroportuárias, as exigências cada vez maiores a nível de responsabilidade ambiental e as imposições a nível de segurança aeronáutica são alguns dos principais desafios que a indústria enfrenta actualmente. É tempo de grandes mudanças no sector.

O papel de liderança da IATA é fundamental para garantir que o transporte aéreo permaneça como sendo uma das indústrias mais dinâmicas do mundo. Desde 2002 a IATA lidera uma agenda de transformação da indústria, em resposta aos desafios atras apontados: Tal agenda assenta em três grandes linhas de actuação:

v      Segurança Operacional:
A segurança é prioridade numero 1 da IATA, e a meta consiste em melhorar continuamente os padrões de segurança, nomeadamente através da IATA Operational Safety Audit (IOSA), cuja certificação constitui pré-requisito para qualificação como membro IATA .

v      Simplificação do Negócio, - Simplifying the Business:
Com recurso às modernas tecnologias, procura-se melhorar o serviço prestado, reduzindo custos e aumentando eficiência, com implementação da filosofia de paperless, em cinco áreas essenciais: Emissão de bilhetes de passagem e carta de porte (E-ticketing e E-freight), sistema de check-In, identificação de bagagem e emissão de cartão de embarque.

v      Responsabilidade Ambiental:
A aviação não está alheia à questão candente da actualidade no concernente às alterações climáticas. O lema é: minimizar o impacto do transporte aéreo sobre o meio ambiente. A União Europeia já tomou medidas neste âmbito a fim de mitigar os impactos da aviação no clima, com a aprovação de legislação que visa incluir a aviação no regime de comércio de emissões da UE (UE Emissions Trading Scheme).     

É no contexto desse ambiente de grandes desafios para a industria da aviação civil que a TACV ascende a condição de membro activo de pleno direito da IATA, posição que, para além de lhe conferir voz activa nos órgãos decisórios da IATA, lhe abre as portas a uma das maiores organizações comerciais do mundo, com mais de 60 anos de experiência em aviação comercial.

Dos 53 países do continente africano, Cabo Verde é o 19º país cuja companhia aérea é admitida como membro da IATA e primeiro da região CEDEAO.

Por: Carlos Monteiro
Coordenador do processo de candidatura da TACV a membro da IATA

Publicado pelo "A Semana online" em 22 Dezembro 2009
http://www.asemana.publ.cv/spip.php?article48308&ak=1

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO (IDH) NUMA PERSPECTIVA ESSENCIALMENTE TÉCNICA


 “As pessoas são a verdadeira riqueza de uma nação.”
Mahbub ul Haq – Economista paquistanês, autor da formula de cálculo do IDH.

Uma incursão pela história do pensamento económico pode nos revelar que desde os tempos remotos sempre existiu a preocupação de se quantificar a riqueza ou o poder económico de um pais ou região num determinado momento da sua história.

No feudalismo, o poder residia basicamente nas dimensões do feudo e na sua capacidade produtiva consubstanciada na força de trabalho dos servos do senhorio. Já na época do mercantilismo, o sistema económico sucessor do regime feudal na Europa ocidental, a riqueza de uma nação era avaliada pelo stock de metais preciosos acumulados, particularmente do ouro e da prata. São, de facto, etapas da história da humanidade em que denominações como “desenvolvimento humano”, “bem-estar social” ou “justiça social” eram conceitos inequivocamente estranhos às preocupações e desafios desse período da história.

Com o advento das teorias da economia contemporânea, a partir da publicação de “A Riqueza das nações” de Adam Smith (1723-1790), introduziu-se o conceito de Produto Interno Bruto (PIB) para quantificar de forma mais concisa a riqueza gerada por um pais num determinado momento. Assim, durante longos anos, o PIB e o rendimento per capita tinham sido os únicos instrumentos econométricos utilizados para classificar um pais como sendo “rico”, “menos rico”, “pobre”, ou “muito pobre”.

O rendimento per capita, sendo uma média aritmética simples obtido do quociente do PIB pelo número de habitantes, pode camuflar e, efectivamente, distorce em grande medida, o panorama socio-económico da população de um país. Pelo simples facto de nem sempre existir uma proporção lógica entre a riqueza produzida por um determinado país e a qualidade de vida da respectiva população. De modo que o indicador BIP não pode e nem deve ser considerado como um fim em si próprio. É apenas um meio que permite à população ter melhor acesso à saúde e à educação, dependendo das políticas de distribuição de renda adoptadas pelos governos, entre outros factores.

A ONU, através da sua agência PNUD, esteve durante um longo período empenhada na busca de uma metodologia de cálculo que melhor retratasse o estágio de desenvolvimento de um pais, capaz de combinar o crescimento económico com o nível de desenvolvimento humano.

Até que, em 1990, um economista Paquistanês coadjuvado por um colega Indiano, equacionou uma fórmula bem acolhida pela comunidade internacional. O mérito residia no facto de terem conseguido combinar o crescimento económico com indicadores do bem-estar social designadamente, educação e esperança média de vida à nascença, admitindo que este ultimo, depende de factores como saúde e um padrão de vida condigno da população. O IDH é também uma média aritmética simples de três indicadores: taxa de escolaridade, esperança média de vida à nascença e o rendimento per capita ajustado pela chamada Paridade de Poder de Compra (PPC).

O objectivo central do IDH não consiste em comparar índices entre diferentes países, como se de uma competição se tratasse, até porque existem factores de natureza religiosa, cultural e histórica que, em muitos casos, dificultam a comparabilidade do que se pode designar de “bem-estar social” entre diferentes países do mundo.

O propósito primordial do IDH visa determinar a posição em que cada país se encontra numa escala de 0 a 1 em que a meta “1” representa a satisfação plena das necessidades da população, seja do ponto de vista material, seja do ponto de vista espiritual. E nessa perspectiva, interessa mais observar a evolução histórica dos índices de um determinado pais, particularmente as alterações ocorridas em períodos quinquenais.


IDH de CABO VERDE desde 1990
ANO
1990
1995
2000
2005
2006
2007
Índice
0,589
0,641
0,674
0,692
0,704
0,708


O ranking organizado pela PNUD acaba, efectivamente, por revelar o fosso de desigualdades, por exemplo, entre a Noruega (no topo da lista) e Níger (no último lugar), num universo de mais de 180 países.

Todavia, interessa analisar também o grau de eficiência das políticas públicas de um país na conversão da riqueza gerada no seu território em bem-estar social para a respectiva população. Tal eficiência pode ser obtida da subtracção da ordem do PIB per capita pela ordem do IDH, cujo resultado pode ser um número positivo ou negativo. No caso de Cabo Verde, esta operação resulta num número positivo igual a 5, e o Gabão, por exemplo, cujo IDH situa-se na posição 103º, tem uma ineficiência de -49, situação característica de alguns países produtores de petróleo em que é bastante acentuada a desproporção entre o rendimento per capita e o IDH, a sinalizar de que a riqueza é concentrada em mãos de uma minoria.

Publicado em 23/10/2010
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=25550&idSeccao=527&Action=noticia

terça-feira, 19 de outubro de 2010

ESTACIONAMENTO NA PRAIA: UM GRANDE QUEBRA-CABEÇAS

Quem, todos os santos dias, tem a obrigação de ofício de se deslocar de carro ao Plateau, sabe a dor de cabeça que tem sido encontrar um espaço para estacionar sem correr o risco de apanhar uma cacetada de multa da Policia. Pelo mundo afora, os que trabalham nos grandes centros urbanos normalmente evitam utilizar o veiculo particular para optarem pelo transporte publico em razão das complicações relacionadas com o estacionamento. Na Praia, convenhamos que, o sistema de transporte publico ainda está longe de desencorajar a utilização do veiculo particular.

Em conversas de bar, já se aventou variadíssimas alternativas de solução a esse problema. Mas, esta questão, muito provavelmente, deve encontrar-se num processo de estudo. Sim, a ser estudada. Porque nós os cabo-verdianos temos a mania de estudar. Sempre que se nos depara algum tipo de problema, perdemos meio século a estuda-lo. Não é por acaso que um especialista europeu para assuntos africanos teria utilizado, com certa ênfase, a expressão “Many study, little implementation” para se referir a falta de pragmatismo dos africanos constatado nas suas diversas deslocações em missão de serviço ao continente.

Quem sabe, no futuro teremos Metropolitano a funcionar 24 horas ao dia, com - Linha Azul - ligando Ribeira Grande de Santiago ao centro da cidade no Plateau. Linha Vermelha – a passar por Achada Santo António, Achadinha, Lem-Cachoro e Paiol. Trem de alta velocidade a ligar Praia – Assomada – Tarrafal. Nessa altura sim, o veiculo particular ficará fechado em casa, e os santiaguenses vão recorrer ao Metro ou ao Trem para se deslocarem ao Plateau.

Entretanto, enquanto não chegarmos lá, há necessidade de uma gestão mais criteriosa dos espaços de estacionamento na Praia, melhorando a sinalização e delimitando os lugares para cada veiculo de forma a maximizar a utilização dos escassos espaços disponíveis.

Certas instituições têm espaço reservado de sobra, para os respectivos funcionários e clientes, para operação de carga e descarga quando bem entenderem. Mas, nem todos têm esse privilégio. O recinto de Diogo Gomes, que sempre tem sido utilizado como parque de estacionamento, sobretudo pelos funcionários do Banco e outras instituições próximas, tem estado completamente vedado ao estacionamento de veículos.

Todo o espaço ao redor do edifício do BCV, ou está reservado ou é proibido estacionar. Defronte à Garantia, é reservado a essa instituição. E assim podemos alistar uma dúzia de situações idênticas. Até parece a tal historia da divisão de um queijo entre o lobo e o macaco.

Pergunta-se: Qual é o direito que uma instituição ou cidadão tem de ter reservado um espaço público para uso exclusivo, sem pagar nenhuma contrapartida, e que nós os outros não temos? Afinal de contas, não pagamos exactamente os mesmos impostos?

Em matéria de multa por infracção ao código da estrada, Cabo Verde se distingue pela originalidade até dos países europeus. Na Europa, sem incluir Portugal de onde copiamos quase tudo, uma multa relacionada com o estacionamento situa-se em média em 45 Euros (5000 escudos aproximadamente). E esse valor é fixo. Não existe infracção grave ou menos grave, nessa matéria. Entretanto, em Cabo Verde, com o nível salarial médio de longe inferior à Europa, a punição das infracções em matéria de estacionamento varia entre 10 a 20 mil escudos. Portanto 200 a 400% superior ao valor praticado na Europa.

Um veiculo no parque, ou está estacionado de acordo com as regras do código de transito ou não. Não existe o meio termo. Por isso não se compreende por que razão as multas variam entre um valor mínimo e máximo. Fica ao critério do agente policial que, tendo um poder discricionário demasiado grande sobre o cidadão, tanto pode lhe aplicar dez mil como decidir pelo extremo de vinte mil escudos. Azar de um cidadão que num espaço de um mês tenha que pagar duas multas de vinte mil escudos. Já imaginou!

Publicado no Liberal em 15/12/2009

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

IRMÃOS FRANCISCANOS CAPUCHINHOS, OS VERDADEIROS IRMÃOS DA ILHA DO FOGO

Quando em 1525 o Papa Clemente VII concedeu ao Frade Franciscano Mateus de Báscio uma benévola aprovação ao seu estilo de vida de pregador itinerante, esse humilde sacerdote mal trajado, de capuz pontiagudo não podia imaginar que estava a iniciar uma família religiosa de cariz essencialmente solidaria que viria a beneficiar uma pequena ilha tão distante no tempo e no espaço.

A ordem capuchinha, uma das ordens religiosas mais fortes e prestigiadas dentro da igreja católica, tem origem nos ideais de São Francisco de Assis (1182 - 1226), tendo sido oficialmente proclamado no ano de 1528 como uma das ramificações do projecto maior que foi a congregação franciscana.

Embora a ordem tenha mais de 500 anos, os primeiros Capuchinhos desembarcaram em Cabo Verde no ano de 1947, um ano dramático para o povo das ilhas, marcado pelas consequências dos sucessivos anos de seca e fome que grassavam pelas ilhas. Só a ilha de Santiago perdeu mais de metade da sua população entre 1946 e 1948 vitima das estiagens. Efectivamente, encontraram uma situação muito pior do que podiam imaginar. Paralelamente a actividade de evangelização deram inicio a inúmeras acções de cariz social, privilegiando em particular o sector da educação e formação dos jovens. É inegável que a formação moral e intelectual das ilhas deve muito à contribuição da igreja católica ao longo da sua história em Cabo Verde.

A ilha do Fogo desde o início beneficiou-se em muito com a presença dos Padres Capuchinhos, sendo a Escola Materna em São Filipe, uma referencia antiga bem conhecida de todos os foguenses. Hoje, a melhoria da qualidade de vida de grande parte da população do Fogo deve-se em parte à acção solidária e fraterna dos Irmãos Capuchinhos. Sendo a escassez de água potável um dos problemas que mais tem afligido a população, algumas centenas de cisternas foram construídas em toda a ilha mas sem descurar a atenção que sempre dispensaram a educação. Assim foram igualmente edificadas varias escolas e Jardins-Infantis em todo o interior da ilha onde a população é naturalmente mais vulnerável e com menos possibilidades de garantir o ensino pré-escolar aos filhos.

Mas este pequeno texto visa sobretudo destacar dois empreendimentos de grande envergadura frutos da determinação e do trabalho árduo desses soldados da fraternidade. Trata-se do Centro Sócio-Sanitário São Francisco de Assis em São Filipe e do projecto de produção de vinho “Maria Chaves” localizado na zona Sul da ilha.

Mais conhecido como Hospital São Francisco de Assis e localizado nos arredores de São Filipe O Centro Sócio-Sanitário de Cutelo de Açúcar, dispõe de equipamentos modernos e oferece consultas e serviços especializados que antes só eram possíveis na cidade da Praia. Deste modo as evacuações de pacientes do Fogo e da ilha Brava para o Hospital Agostinho Neto reduziram-se substancialmente.

Outro empreendimento de grande utilidade para a ilha do Fogo trata-se do projecto de produção de vinho “Maria Chaves” que prevê a produção de 200 mil litros de vinho ano, garantindo emprego a cerca de 40 chefes de família. Mais de cem mil cepas proveniente de Itália estão já a ser plantados numa área de 25 hectares de terreno, irrigada pelo sistema gota-a-gota. O conhecido vinho do Fogo, sobretudo o branco, é um produto típico de Cabo Verde com boa aceitação quer seja a nível nacional quer seja na diáspora e que conta com um grande pontencial de mercado na emigração. Por conseguinte tem todas as condições de mercado para ser um projecto economicamente viável. A produção actual não tem tido capacidade de resposta a procura interna para não se referir às solicitações da emigração.

Ambos os projectos têm como mentor um grande irmão da Ilha do Fogo, o Padre Octávio Fassano cujo mérito no trabalho em prol da ilha foi reconhecido pelo Presidente da Republica que o condecorou há bem pouco tempo. O Padre Octávio Fassano que tem ainda em carteira um projecto de um auditório para a ilha do Fogo a ser concretizado ainda este ano, é cidadão italiano, e com a sua boa vontade e colaboração de muitos outros, tem feito prodígios na ilha do Fogo, a provar que nem só de politiquices vive uma ilha.

Publicado no Liberal em 06/04/2009
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=22937&idSeccao=527&Action=noticia

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

OPORTUNIDADES E OPORTUNISMOS, A OUTRA FACE DA CRISE

A crise é, hoje, tema de conversas e noticias por toda a parte: na Radio, na TV, nos Jornais, o assunto principal gira em torno da CRISE. Quem assim ouve tanta lengalenga, pode pensar que nós vivíamos em fartura e agora estamos tramados por essa desgraça que a principio fora apenas um grande calote do mercado imobiliário nos Estado Unidos da América. Convenhamos que Cabo Verde, com maior ou menor intensidade, sempre vive em crise; porque a nossa crise é de outra natureza; tem a ver com a falta de chuva, seca, ano de má colheita; isso sim, é que é crise para os cabo-verdianos. De modo que não tem sido fácil para qualquer um entender as jogadas que estão por de trás dessa grande encenação chamada de “crise financeira mundial” propalada a quatro ventos, em muitos casos com o propósito de criar um clima de insegurança e apreensão entre os trabalhadores e assim conseguir deles maiores sacrifícios, porquanto tem sido a classe sempre solicitada a “apertar o cinto”, nessas situações.

Hoje, a crise serve de desculpas para tudo, para encobrir incompetência e disfarçar mazelas que eventualmente nada têm a ver com a depressão económica no verdadeiro sentido. Assim, o pobre do trabalhador de uma das unidades hoteleiras do Sal terá sido despedido sob o pretexto de que a crise já desembarcou em Cabo Verde. Tendo assim uma boa desculpa, ninguém se esforça para encontrar outra explicação para as alterações no fluxo de trafego turístico para a ilha do Sal, que não seja a crise. Segundo consta, o trafego turístico para Cabo Verde aumentou substancialmente no primeiro trimestre de 2009 e a ilha do Sal provavelmente não registou a mesma pressão dos anos anteriores, não por causa da crise, mas pelo desvio do trafego para a Boavista. Como se sabe, a capacidade de acomodação na ilha da Boavista aumentou consideravelmente com a entrada em funcionamento do Hotel Riu Karamboa e hoje são operados mais de uma dezena de voos semanais directamente da Europa para o aeroporto de Rabil, o que não acontecia nos anos anteriores.

Não é por acaso que os chineses costumam dizer que as crises são momentos sublimes para se encher as burras ou influenciar pessoas. Continua ainda bem fresca a historia recente de um tal mercenário, trazido a peso de ouro, para num passe de mágica transformar uma certa empresa publica supostamente em crise, e a sua primeira decisão foi despedir mais de uma centena de trabalhadores de nível salarial inferior. Só que fazendo bem as contas, provavelmente, o que o dito mercenário recebeu entre salários, bónus e benesses deve ser muito superior à economia conseguida com tal redução de pessoal. Mas, como se costuma dizer, a corda estoira sempre do lado do mais fraco, e assim, na falta de capacidade para se desenvolver uma estratégia de gestão sustentável que viabilize uma empresa, a solução mais simplista que salta a vista é o despedimento de pessoal.

A nível mundial, destacadas personalidades e organizações sindicais têm denunciado uma onda de aproveitamento da crise para tomada de medidas contra os trabalhadores, aumentando o desemprego ou reduzindo direitos sociais em situações que nada tem a ver com a crise propriamente dita. No Brasil, por exemplo, um colectivo de mais de duas centenas de profissionais do foro judicial entre os quais se destacam juizes, promotores, procuradores e advogados, preocupados com a onda de aproveitamento oportunista da crise, assinaram um manifesto intitulado: “Contra o Oportunismo e em Defesa do Direito Social”, como forma de alertar o poder público a não embarcar na cantiga do patronato.

Economistas de renome internacional reconhecem também que o desemprego pode não ser a melhor alternativa para a superação da crise. Mais desemprego pode significar menos dinheiro a circular e por conseguinte menos consumo e agravamento da situação. E apontam a concertação social como a melhor via para a superação dessa crise global. A recuperação da economia mundial, como muitos admitem, não passa apenas pela distribuição de dinheiro aos bancos e grandes empresas, como requer também ajuda efectiva à classe mais desfavorecida.

Com efeito, a par do aproveitamento oportunista da situação que eventualmente possa ocorrer, há contudo, entre nós, quem considere ser a crise uma grande oportunidade de fazer negócios e promover o crescimento económico nacional. E não é para menos, se tivermos em conta os projectos de investimentos no ramo da imobiliária turística que vêm sendo anunciados e que envolvem milhões de Euros dos quais se destacam: Tortuga Beach Resort, Estrela Santiago, só para mencionar alguns. E até já foi anunciado a abertura de um novo banco, enquanto pelo mundo afora muitos bancos têm dificuldades em manter as portas abertas.

Publicado no Liberal em 22/04/2009
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=23116&idSeccao=527&Action=noticia

CRISE FINANCEIRA MUNDIAL - QUEM PAGA AS CONTAS?

Em 1993 Bill Clinton assumia a presidência dos EUA numa conjuntura de particular optimismo à escala mundial. A queda do muro de Berlin, em Novembro de 1989, marcara o fim da guerra fria e da divisão do mundo em blocos antagónicos e encerrou um ciclo histórico, dando início a uma nova era com o relançamento da globalização económica. O desenvolvimento tecnológico, particularmente das tecnologias de informação, o surgimento da telefonia celular, a massificação da Internet imprimiram uma nova dinâmica à economia dos Estados Unidos e do resto do mundo por arrastamento.

Uma Nova Economia baseada na alta tecnologia começava a expandir-se e a desencadear uma espiral de acumulação de riquezas e progressos sem limites. Segundo opinião de especialistas dessa Nova Economia Neo-liberal, as inovações tecnológicas produzem rendimentos que estimulam um processo de inovação continua, que por sua vez incentiva a expansão e acumulação de riquezas. A cotação das acções de empresas online conhecidas por “ponto-com ou dot-com”, das quais se destaca a Amazon.com, disparou nas bolsas de valores, a partir de 1997.

O sucesso do comércio electrónico e a ilusão da possibilidade, quase ilimitada, de fazer negócios online fizeram crescer de modo vertiginoso o interesse pelas acções das empresas “dot-com”. As acções da Amazon.com, por exemplo, cresceram de 18 dólares aquando da Oferta Pública Inicial em Maio de 97 para o valor recorde de 209 no início de 1999. Um importante executivo de uma dessas empresas teria afirmado que “nesse admirável mundo novo para que as pessoas enriqueçam, basta haver vontade e desejo.” A especulação desenfreada nos mercados de acções começou a partir de 1997 a inflar a chamada “bolha financeira da Internet” que viria a estourar no ano de 2000, exactamente no fim do mandato de Clinton. O sucesso das empresas “ponto-com” desfez-se como um castelo de areia e trilhões de dólares “sumiram” num passe de mágica, habilidade que provavelmente acontece apenas nas bolsas de valores.

O presidente Bush assumiu-se como inquilino da Casa Branca, em 2001, numa altura em que a economia dos Estado Unidos encontrava-se em situação debilitada. Nos dois primeiros anos da sua administração a economia não demonstrava sinais de recuperação, permanecendo em relativa letargia. Era urgente, por isso, implementar medidas que dessem alento ao mercado.

Assim, em 2003, o Banco Central americano (Federal Reserve, o Fed), com o propósito de reanimar a economia, decidiu fixar a taxa de juros a 1%, a mais baixa nos últimos 50 anos. Com os juros a esse nível e outros incentivos públicos, desencadeou-se uma avalanche de empréstimos hipotecários sobre habitações sobretudo no segmento da população de baixa renda e portanto com maior risco de insolvência, o chamado segmento subprime. A valorização dos imóveis atingiu níveis sem precedentes e o negócio imobiliário surgiu como o novo trampolim de acumulação de riquezas. O acesso ao crédito fácil e barato, fez disparar o consumo e uma nova euforia tomou conta dos mercados, com o negócio imobiliário a movimentar trilhões de dólares.

À semelhança do que acontecera com as empresas “ponto-com”, estava-se a inflar uma segunda bolha financeira com a especulação nas Bolsas a ultrapassar todos os limites. Temendo que a febre do consumismo aquecesse também a inflação, o Fed foi gradualmente aumentando a taxa de juros: de 1% em 2003 atingiu o patamar de 5.5% no início de 2007. A taxa básica de referencia do Banco Central tem impacto directo na taxa de juros dos bancos comerciais, de modo que, com os sucessivos aumentos os mutuários começaram a ter dificuldades em honrar os compromissos bancários, e a situação de endividamento rapidamente transformou-se numa bola de neve.

Os primeiros sinais de perturbação partiram do Banco BNP Paribas Investment Partners em Agosto de 2007. Seguiram-lhe o Citigroup, UBS, Bear Strearns, grupos financeiros de porte mundial que anunciaram perdas de biliões no negócio de financiamento imobiliário.

O mercado caiu em pânico, os preços dos imóveis entraram em queda livre e um ano depois a crise financeira mundial estava confirmada, com a falência anunciada de gigantes do sector financeiro como o banco Lehman Brothers, a seguradora AIG e das gigantes hipotecárias Fannie Mae e Freddie Mac entre várias outras instituições do sector financeiro.

Com efeito, o financiamento do mercado imobiliário americano, um negocio que ascende à cifra de 12 trilhões de dólares, envolve bancos europeus e asiáticos, por isso o estrago em pouco tempo espalhou-se pela teia financeira mundial, arrastando consequências mais gravosas que no caso da derrocada das empresas “ponto-com” em que o rombo fora calculado em apenas 3 trilhões de dólares.

As coisas chegaram a um ponto em que os governos têm que entrar em acção, para evitar o pior. Assim, um pouco por toda a parte, os governos vão injectando dinheiro dos contribuintes para socorrer as instituições financeiras afectadas pela crise. Portanto, quem irá pagar as contas dessa desgraçaria toda, são os que nada têm a ver com essa história: Os contribuintes, o cidadão comum. Numa linguagem mais crua é o que se pode chamar de “roubar aos pobres para distribuir aos ricos”.


Publicado no Liberal em 23/03/2009

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

UM REENCONTRO 25 ANOS DEPOIS

Dizem que a amizade construída nos bancos da escola resiste às intempéries, atravessa os tempos e perdura para sempre. Talvez seja verdade. Talvez, o certo é que hoje vivemos num mundo marcado pelo individualismo a degenerar-se pelo egoísmo exacerbado e materialismo avarento. Um mundo em que a amizade sincera tornou-se numa espécie rara em vias de extinção, quiçá por incapacidade de adaptação aos tempos modernos em que os valores morais subverteram-se a preponderância de bens materiais, do vale tudo e do salve-se quem puder. E, quando neste universo adverso alguém ou um pequeno grupo de pessoas tomar a iniciativa de reunir antigos colegas do banco da escola para num acto simbólico homenagear dois colegas finalistas que o destino prematuramente roubou a vida (NapoLeão Azevedo, Pilas e Luís Mendes, Xema) é algo de extraordinário e que merece ser aplaudido.

Aconteceu na sexta feira, 16 de Janeiro, no Restaurante Plaza-Park em Achada Santo António onde os finalistas do 7º Ano do Liceu Domingos Ramos, ano lectivo 1983/84 puderam se reencontrar após um período de 25 anos, com o nobre propósito de lembrar os dois ex-colegas acima mencionados: Pilas era um brincalhão, amigo de todos, sempre tinha uma anedota para distrair a malta. Possuía a mestria de temperar com o bom humor qualquer situação complicada mesmo quando as coisas saia-nos pelo torto, como aconteceu numa certa ocasião em que andamos pelo platô a angariar apoios para realização de um “passeio-convívio” e fomos mal acolhidos pelo proprietário de uma certa casa comercial. Mas felizmente contávamos sempre com o apoio formidável da então Transcor em termos de transporte e de outras instituições, assim regularmente podíamos, com alguma facilidade, organizar excursões para o interior de Santiago. O Xema, mais reservado e de bom caracter, era um amigo que não faltava às “balizinhas”. Dominava Matemática e Física como um domador de leões em apresentações de circo. Um colega dado às ciências exactas, por assim dizer. Ultimamente vivia em França e foi com muita consternação que tomamos conhecimento do seu falecimento. O NapoLeão seguiu a carreira de docência e foi Director do Liceu da Várzia.

Em ambiente descontraído e de confraternização (sobretudo porque não estava presente o chefe da turma) lá se foi revivendo passagens que por algum motivo ficaram marcadas e não faltou quem trouxesse à baila o 111, as “balizinhas” e por ai fora. Nem todos puderam estar presentes, como é obvio, mas boa parte compareceu. Convém lembrar também que éramos pouco mais de uma centena de finalistas, alunos provenientes de toda a região de Sotavento, porquanto havia um único Liceu a cobrir as ilhas de Santiago, Fogo, Brava, Maio e por vezes o Sal. Um único Domingos Ramos para a região sul a funcionar como Liceu e como Assembleia Nacional Popular de improviso no Salão “Josina Machel”. Mas nem por isso sentíamos coibidos com o aparato parlamentar com que tínhamos de conviver por ocasião das sessões. Da escadaria da entrada principal divertíamos, observando a chegada dos deputados, de fato ou de balalaica, cada qual no seu estilo pessoal. Não havia computador e muito menos Internet e conhecíamos “Magalhães” como professor de Geografia. Mas foi com agradável satisfação que podemos constatar que, concluído o ensino secundário, ninguém foi para o brejo. A turma se transformou num leque variado de profissionais: professores, jornalistas, empresários, engenheiros, economistas e ate um sacerdote. E porque não admitir que tal sucesso deveu-se, entre outros aspectos, a valores que nos foram transmitidos pelos professores? Afinal, quem entre nós, consegue esquecer o respeitado Professor Antero Barros ou o grande mestre de Filosofia, o amigo Professor Djick.

Uma sessão de fotografias dos que já são vovós fechou o encontro. Parabéns aos promotores da iniciativa, Ana, Lina, Tany e Lourenço.  Valeu pessoal, até próxima.


Publicado no Liberal em 02/02/2009
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=22208&idSeccao=543&Action=noticia

AFINAL, PARA QUANDO A REDUÇÃO DO PREÇO DOS COMBUSTIVEIS EM CABO VERDE?

Na primeira semana do mês de Julho de 2008, o preço do petróleo no mercado internacional bateu o recorde histórico de 147 dólares o barril. Se por um lado a escalada do preço de hidrocarbonetos representava um sufoco para o consumidor final, para as empresas petrolíferas constituía oportunidade impar de acumulação de avultados lucros e sucessiva valorização da respectiva cotação nas bolsas de valores. A Shell, por exemplo, uma das maiores multinacionais do sector petrolífero, anunciou, em finais de Janeiro deste ano, o seu recorde histórico de resultado positivo apurado em 2008 - 31.4 biliões de dólares. A Exxon Mobil, a petrolífera americana, também já anunciou a distribuição recorde de dividendos referentes ao ano transato no montante de 40 biliões de dólares. Não seria de todo falacioso concluir que o aumento do preço dos combustíveis ao consumidor final não se justifica apenas pelo incremento do preço do brent como também camufla boa dose de ganância por ganhos exorbitantes.

Com o aumento desenfreado do preço no mercado internacional, enquanto os consumidores suportavam facturas cada vez mais onerosas, as empresas do ramo contabilizavam lucros de até 70 milhões de Euros por dia. Situação preocupante que levou o primeiro-ministro luxemburguês, a avançar com a ideia de uma tributação adicional sobre os lucros das petrolíferas, as principais beneficiadas da alta do preço do petróleo. Entretanto, esta proposta caiu por terra, com a oposição intransigente da Holanda e de mais outros três países. E não é de se estranhar a posição da Holanda se tivermos em conta que a Shell é uma gigante anglo-holandesa.

No segundo semestre de 2008 assistimos à desvalorização do ouro negro no mercado internacional. E assim, a partir do mês de Julho, a cotação entrou em queda livre, tendo registado, em Novembro, uma perda de mais de 100 dólares por barril que chegou a ser cotado a 40 dólares nas principais bolsas de valores do mundo. De Novembro a esta data o preço manteve-se relativamente estável, situando-se na casa dos 40–45 dólares o barril, o mesmo preço pelo qual foi comercializado em 2004. Quase cinco meses depois de ter atingido a cotação mais baixa dos últimos cinco anos, em Cabo Verde o preço dos combustíveis ainda continua nos píncaros.

No decurso do ano de 2008, o ajustamento do preço a nível nacional acompanhou a par e passo a escalada no mercado internacional, com a reacção quase imediata das autoridades competentes nessa matéria. Assim, o primeiro ajuste do ano chegou a 26 de Março, o segundo aumento a 27 de Junho e o terceiro a 05 de Setembro. A reacção interna acontecia com intervalos de 2 meses ou até menos, como foi o caso do ajuste verificado a 5 de Setembro. Um governante, questionado sobre os sucessivos aumentos, teria afirmado que “O que está a acontecer em Cabo Verde está a acontecer em todos os países do mundo, que estão sob esta pressão inflacionista...”. Nada a reclamar. Só que a situação inverteu-se “em todos os países do mundo” e em Cabo Verde desta feita não tem estado a acontecer o mesmo.

A explicação da Agencia de Regulação Económica de que o stock actual de combustível teria sido adquirido quando o preço do crude estava nas nuvens já não convence ninguém. Pelo espaçamento temporal com que os aumentos verificaram-se em 2008 pode-se inferir que a capacidade de armazenagem das empresas nacionais é de aproximadamente 2 a 3 meses. Entretanto entramos já no quinto mês, desde que o preço do petróleo atingiu o nível de 2004 no mercado internacional, e continuamos ainda em Cabo Verde com o tal stock comprado a peso de ouro. Já houve algumas ligeiras reduções como que simplesmente para ludibriar o consumidor. Ora, em 2004 a gasolina, por exemplo, foi tarifado a 110 escudos o litro, enquanto hoje pagamos 167 escudos, com o brent a ser comercializado ao mesmo nível de há cinco anos. Sabemos que está aí inclusa a tal Taxa de Manutenção Rodoviária, mas esta constitui matéria bastante para um outro texto.

Bem que se podia aproveitar agora que o ouro negro está a ser vendido a preço de banana para se fazer uma boa armazenagem de combustível e assim nos compensar quando a situação se inverter no mercado internacional. Caso contrário corremos o risco de apenas ouvir falar de preços baixos porque a 15 de Março próximo os integrantes da OPEP vão se reunir em Viena para entre outras questões decidir uma segunda corte consecutiva na produção diária e assim estimular o incremento do preço por barril.

Uma outra questão pertinente, é que enquanto o preço dos combustíveis ia sofrendo aumentos sucessivos, os fornecedores de energia, água e serviços de transporte reclamavam o aumento das respectivas tarifas. Será que com a eventual redução do preço dos combustíveis essas tarifas serão revistas? Ficamos aguardando.

Publicado no Liberal em 05/03/2009
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=22494&idSeccao=527&Action=noticia

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

QUAL O INTERESSE DA EUROPA EM ESTABELECER UM “ACORDO DE MOBILIDADE” COM CABO VERDE

Historicamente a Europa foi um continente com excedente populacional. Até o início da Segunda Grande Guerra, mais de 50 milhões de pessoas deixaram o território europeu para se estabelecerem nas promissoras terras do novo continente. Actualmente, essa mesma Europa que no passado “exportou excedente populacional”, atravessa uma crise demográfica sem precedentes. Segundo o resultado de um estudo do Instituto Europeu de Estatística, o Eurostat, a população dita europeia, não apenas estagnou em termos de crescimento, como está a envelhecer rapidamente. Estima-se que em 2050 um terço da população terá idade superior a 65 anos. A Europa corre assim o risco de, a longo prazo, se transformar num lar de terceira idade. O referido instituto calcula que em 2015 a taxa de mortalidade deverá ultrapassar a da natalidade, estando na imigração a única solução para o problema de decréscimo populacional. O fenómeno de envelhecimento da população agravado pela taxa negativa de crescimento demográfico terá, com certeza, implicações nefastas na produtividade, no desenvolvimento económico e em todo o potencial de crescimento da Europa. Por conseguinte, para continuar próspera e a competir com os Estados Unidos e com os países emergentes, a União Europeia não só precisa de mão-de-obra jovem e qualificada como também necessita de “braços” para suprir as necessidades sobretudo nas áreas em que o europeu não está disposto a aceitar o emprego.

Vinte milhões de trabalhadores qualificados é o número apontado pelo Eurostat como sendo necessário para colmatar as necessidades de mão-de-obra no espaço da comunidade nos próximos anos, e a imigração afigura-se como a única solução possível. Entretanto, a problemática da imigração não se coloca de modo pacífico. Ciosa da sua identidade nacional, a Europa teme que uma avalanche de imigrantes contribua para uma nova composição étnica e cultural, pondo em risco, a longo prazo, a identidade típica do velho continente. Interessa-lhe por isso controlar os fluxos migratórios e acolher quem efectivamente preencher determinados requisitos particularmente em termos de qualificação profissional. Efectivamente, existem milhões de pessoas que almejam chegar a Europa mas nem sempre os que querem lá chegar (como os que se aventuram em canoas pelo atlântico) são os que a Europa deseja receber.

Franco Frattini, Vice-Presidente da Comissão Europeia surgiu então com uma iniciativa interessante, e que foi bem acolhida pelos seus interlocutores: a criação de um “Cartão Azul” que permite a entrada da necessária mão-de-obra por um tempo limitado, regressando, no término de um contrato de trabalho, ao seu pais de origem. Sem a possibilidade de fixação definitiva, o que implicaria a deslocação de toda a família, o imigrante não irá, por exemplo, sobrecarregar a demanda por serviços públicos tais como educação, saúde, entre outros, como também fica precavida a possibilidade de uma indesejada miscegenação a longo prazo da população europeia.

Um dado assente é que a Europa precisa de mão-de-obra, mas não quer que a mesma se estabeleça definitivamente no seu espaço sobretudo porque essa necessidade de “braços” em certos países da União revela-se de caracter sazonal, entre outros aspectos a ter em conta. A fixação definitiva poderá também contribuir para o agravamento da problemática da integração social dos “antigos” imigrantes e seus descendentes que a Europa já vem enfrentando. No período pós Segunda Guerra Mundial, teriam sido bem-vindos para ajudar na reconstrução da Europa. Entretanto a ausência de uma política de inserção social fez com que os imigrantes e seus descendentes, em determinados países, acabassem abandonados à sua sorte em guetos e bairros suburbanos, chegando-se ao absurdo de apesar dos filhos nascerem no espaço europeu e de nunca sequer terem pisado a terra de origem dos pais, as autoridades não lhes reconhecem a nacionalidade europeia. Esta é a realidade de milhões de jovens descendentes de imigrantes que nasceram (e vivem) na Europa. Sem a nacionalidade do país de nascimento naturalmente não gozam da mesma oportunidade seja no sistema de ensino, seja no mercado de trabalho. Situação frustrante que nos ajuda a melhor compreender a onda de violência e distúrbio social que assolou a França em Outubro de 2005 em que centenas de veículos e vários estabelecimentos comerciais foram violentamente incendiados e vandalizados em várias cidades. Essa constatação desencoraja a Europa a acolher em caracter definitivo uma nova leva de imigrantes como aconteceu no período pós 1945.

Sem uma perspectiva de crescimento demográfico a longo prazo, a União Europeia busca encontrar soluções além fronteira para o seu mercado de trabalho, sem contudo suportar o peso da fixação definitiva no seu território do imigrante e respectivo descendente. É nesta conjuntura que se pode compreender a assinatura em Junho deste ano de uma “Declaração conjunta sobre a parceria para a mobilidade” entre a União Europeia e Cabo Verde, abrindo assim a possibilidade de estabelecimento de acordos com cada país membro da UE individualmente de modo a permitir o controle de fluxos migratórios legais no âmbito de uma política de emigração circular. A França foi o primeiro país a manifestar interesse no estabelecimento de tal acordo, com a assinatura do acordo no passado 24 de Novembro em Paris pelas autoridades dos dois países. Com efeito, idêntica iniciativa foi também levada a cabo com relação a Moldava, uma ex-Republica soviética. Trata-se por conseguinte de um projecto de grande envergadura da União Europeia, em que esses dois países foram escolhidos nessa fase de arranque, para uma espécie de “ensaio de laboratório”.

Para Cabo Verde representa uma excelente oportunidade de exportação de mão-de-obra, mas também incorpora um desafio ao sistema de ensino e formação técnico-profissional para se poder tirar proveito dessa oportunidade. O ensino técnico actualmente bastante limitado em Cabo Verde (apenas 3% do universo dos alunos frequentam esse tipo de ensino) necessita por conseguinte de um grande impulso para se transformar numa alternativa ao contingente de jovens que por alguma razão abandona ou não completa o ensino geral. Os recursos para financiamento podem advir da UE no âmbito do acordo de Parceria Especial. Ora, a Europa necessita de mão-de-obra para se manter próspera e competitiva, contudo não quer que a mesma se estabeleça definitivamente no seu território, então é justo que ao menos contribua para sua qualificação no pais de origem. De contrario, mais dispendiosa será a árdua missão de patrulhar as águas do atlântico na tentativa ingrata de esbarrar as canoas abarrotadas de miseráveis que se aventuram rumo ao velho continente.

Publicado no Liberal em 08/12/2008
http://liberal.sapo.cv/noticia.asp?idEdicao=64&id=21599&idSeccao=527&Action=noticia