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quarta-feira, 6 de outubro de 2010

CARTA DE UM EMIGRANTE

Sou emigrante cabo-verdiano residente em Luxembourg há já uns pares de anos. Com esta carta pretendo manifestar uma preocupação, que não é só minha mas compartilhada por quase todos os meus patrícios, em relação ao processo de despacho alfandegário de veículos automóveis que ao abrigo da legislação em vigor os emigrantes podem enviar para Cabo Verde.

Nos procedimentos de despacho, a Alfândega normalmente não aceita a factura de compra para determinar o valor sobre o qual deve ser calculado os direitos alfandegários a pagar pelo proprietário do veiculo. Basicamente, tudo fica a critério do agente verificador que pode concordar ou não com o valor proposto pelo despachante. Em caso de haver discordância, além do valor sofrer um aumento considerável o despacho é agravado com uma multa aplicada pela alfândega. 

Ora, ai se situa a questão de fundo. Quando um simples agente da Alfândega discordar de um determinado valor proposto pelo despachante, é licito perguntar qual será então o valor de referencia em que o agente vai se basear para aumentar o despacho.  E a resposta é simples, esse valor de referencia não existe.  A sua determinação fica praticamente à discrição do agente. Por conseguinte, não ha duvidas de que este procedimento é injusto e pode mesmo ser considerado ilegal se enquadrado no âmbito dos princípios gerais de direito universalmente aceites.

A valorização de uma  mercadoria não pode depender de critérios vagamente definidos e muito menos de apreciações pessoais. No caso de um veiculo automóvel em que estão envolvidos somas elevadas devem existir critérios claros, previamente estabelecidos, com a máxima transparência, para que não haja margem a arbitrariedades. E mesmo na condição de leigo nesta matéria arrisco a dar uma dica: Já que a Alfândega não aceita o valor da factura de compra  para calcular os impostos a pagar, devia no inicio de cada ano publicar uma lista contendo todas as marcas e modelos de carros que normalmente são enviados pelos emigrantes com o respectivo “valor para efeitos de despacho” de acordo com o ano de fabrico e outras características do veiculo. 

A tal lista devia ser do conhecimento prévio de todos os interessados, publicada, divulgada e distribuída aos emigrantes. Desta forma qualquer patrício antes de se decidir pela compra do carro “A”  ou “B” já sabe que na Alfândega em Cabo Verde o despacho do carro “A” é calculado sobre o valor “X” e do carro “B” sobre o valor “Y”. 

A partir desta tabela de valorização seria aceitável eventualmente um pequeno ajuste (não mais de 5%, por exemplo) a ser considerado pelo agente verificador, dependendo do estado de conservação do veiculo. Agora, da forma como as coisas são feitas actualmente, ninguém sabe quanto vai custar o despacho de um determinado veiculo. Até parece ser uma lotaria. “Se cair nas mãos de um bom verificador, fica-te por um bom preço, mas se lhe calhar um mau verificador, estas frito”. Assim se comenta na emigração. 

 E foi efectivamente o que me aconteceu recentemente. Levei para Cabo Verde um veiculo cuja papelada acabou por cair nas mãos de um tal verificador que acredito me guardava um certo rancor de uma rixa antiga.

E fritou-me.

Discordou do valor proposto pelo despachante, duplicando-o. Até os seus colegas de serviço acabaram por achar o valor por ele considerado muito elevado, tendo em conta a modéstia do veiculo. Para mim, não interessa se o valor tenha sido abusivamente exagerado ou não, o que importa é que ao se pagar um determinado montante tenha-se em conta a devida transparência e a certeza de que o valor do despacho não esteja a depender da apreciação empírica do agente verificador “A” ou “B” e esse valor deve ser passível de se determinar independentemente do agente verificador a quem couber a tarefa de confirmar o despacho.

Bem, alguém ha de dizer: sempre existe a opção de meter um recurso. E de facto existe esta possibilidade mas tal artificio normalmente não resulta em nada. E como sabemos que não resolve a situação, porque não simplificar o processo(?), imprimindo-lhe maior transparência, como disse, com a publicação de uma lista de classificação dos veículos e o respectivo valor para efeito de despacho. A tal lista já existe nas revista especializadas de vários países onde os próprios agentes económicos interessam-se pela sua publicação, porquanto estabelece preços de referencia nos negócios de veículos de segunda mão e não só. Dai que poderá ser só uma questão de adapta-la a realidade aduaneira de Cabo Verde. Devia-se aproveitar agora com a introdução do IVA a partir de Janeiro/2004, para proceder a esta alteração no processo de valorização dos veículos automóveis, pondo fim desta forma a um certo abuso e arbitrariedade de alguns agentes da Alfândega.

Da forma como as coisas andam, da próxima vez vou levar um burro que além do despacho do gado asinino ser bastante barato na pauta aduaneira de Cabo Verde, o bicho pode retribuir a vingança do agente com dois valentes coices.

Publicado em Novembro de 2004

3 comentários:

  1. Hi, Tens toda a razao, a gente nao sabe realmente o preco do despacho de um carro X ou Y, so sabemos quando o carro estiver la e que o custo aumenta exageradamente, Para mim deveriam fazer o desconto do preco do carro comprado de acordo com o recibo de compra comprovada por um dealer por exemplo, assim a gente fica mais bem informado qual sera o desconto necessario para poder ou nao enviar um carro para Cabo Verde. Obrigado, gostei do teu blog
    Nilton :-)

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  2. Obrigado Nilton pelo comentario e elogio ao Blog.

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  3. Pois e infelismente pais de miseravel, melhor ficar em luxemburgo prque aqui os pobres desgracados esyao fomintos pelo sifrao nao veem a hora de roubar ou aproveitar das situacoes a comecar pela alfandega onde como nos todos sabemos e onde ha mais corupcao. termino dizendo excelente artigo e nunca penses em vir com nada deixa tudo em luxemburgo. abraco

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